Operario em Construção- Vinicius de Moraes
Conselho de hoje: Dance! Dance! Dance!
Era ele que erguia casas
Onde antes so' havia chão.
Como um pássaro sem asas Ele subia com as asasQue lhe brotavam da mão.Mas tudo desconhecia De sua grande missão:Nao sabia por exemploQue a casa de um homem e' um temploUm templo sem religiãoComo tampouco sabiaQue a casa quer ele faziaSendo a sua liberdadeEra a sua escravidão.De fato como podiaUm operário em construçãoCompreender porque um tijoloValia mais do que um pão?Tijolos ele empilhavaCom pa', cimento e esquadriaQuanto ao pão, ele o comiaMas fosse comer tijolo!E assim o operário iaCom sour e com cimentoErguendo uma casa aquiAdiante um apartamentoAlem uma igreja, à frenteUm quatel e uma prisão:Prisão de que sofreriaNao fosse eventuialmenteUm operário em contrucão.Mas ele desconheciaEsse fato extraordinário:Que o operário faz a coisaE a coisa faz o operário.De forma que, certo dia`A mesa, ao cortar o pãoO operário foi tomadoDe uma subita emoçãoAo constatar assombrado Que tudo naquela mesa- Garrafa, prato, facãoEra ele quem faziaEle, um humilde operárioUm operario em construção.Olhou em torno: a gamelaBanco, enxerga, caldeirãoVidro, parede, janelaCasa, cidade, nação!Tudo, tudo o que existiaEra ele quem os faziaEle, um humilde operárioUm operário que sabia Exercer a profissão.Ah, homens de pensamento Nao sabereis nunca o quanto Aquele humilde operário Soube naquele momento Naquela casa vazia Que ele mesmo levantaraUm mundo novo nascia De que sequer suspeitava.O operário emocionado Olhou sua propria mao Sua rude mão de operário De operário em construção E olhando bem para ela Teve um segundo a impressãoDe que nao havia no mundo Coisa que fosse mais bela. Foi dentro dessa compreensão Desse instante solitário Que, tal sua construção Cresceu tambem o operário Cresceu em alto e profundo Em largo e no coração E como tudo que cresce Ele nao cresceu em vão Pois alem do que sabia - Excercer a profissão - O operário adquiriu Uma nova dimensão: A dimensão da poesia. E um fato novo se viu Que a todos admirava: O que o operário dizia Outro operário escutava. E foi assim que o operário Do edificio em construção Que sempre dizia "sim" Comecam a dizer "não" E aprendeu a notar coisas A que nao dava atenção: Notou que sua marmita Era o prato do patrão Que sua cerveja preta Era o uisque do patrão Que seu macacão de zuarte Era o terno do patrão Que o casebre onde morava Era a mansão do patrão Que seus dois pes andarilhjos Eram as rodas do patrão Que a dureza do seu dia Era a noite do patrão Que sua imensa fadiga Era amiga do patrão. E o operário disse: Não! E o operário fez-se forte Na sua resolução Como era de se esperar As bocas da delação Comecaram a dizer coisasAos ouvidos do patrão Mas o patrão nao queria Nenhuma preocupação. - "Convencam-no" do contrário Disse ele sobre o operário E ao dizer isto sorria. Dia seguinte o operário Ao sair da construção Viu-se subito cercado Dos homens da delação E sofreu por destinado Sua primeira agressão Teve seu rosto cuspido Teve seu braço quebrado Mas quando foi perguntado O operário disse: Não! Em vao sofrera o operário Sua primeira agressão Muitas outras seguiram Muitas outras seguirão Porem, por imprescindivel Ao edificio em construção Seu trabalho prosseguia E todo o seu sofrimento Misturava-se ao cimento Da construção que crescia. Sentindo que a violência Nao dobraria o operário Um dia tentou o patrão Dobra-lo de modo contrário De sorte que o foi levando Ao alto da construção E num momento de tempo Mostrou-lhe toda a região E apontando-a ao operário Fez-lhe esta declaração: - Dar-te-ei todo esse poder E a sua satisfação Porque a mim me foi entregue E dou-o a quem quiser. Dou-te tempo de lazer Dou-te tempo de mulher Portanto, tudo o que ver Sera' teu se me adorares E, ainda mais, se abandonaresO que te faz dizer não. Disse e fitou o operário Que olhava e refletia Mas o que via o operário O patrão nunca veria O operário via casas E dentro das estruturas Via coisas, objetos Produtos, manufaturas. Via tudo o que fazia O lucro do seu patrão E em cada coisa que via Misteriosamente havia A marca de sua mão. E o operário disse: Não!- Loucura! - gritou o patrão Nao ves o que te dou eu? - Mentira! - disse o operárioNao podes dar-me o que e' meu. E um grande silêncio fez-se Dentro do seu coração Um silêncio de martirios Um silêncio de prisão. Um siêncio povoado De pedidos de perdão Um silencio apavorado Com o medo em solidão Um silêncio de torturas E gritos de maldição Um silêncio de fraturas A se arratarem no chão E o operário ouviu a voz De todos os seus irmãos Os seus irmãos que morreram Por outros que viverão Uma esperanca sincera Cresceu no seu coração E dentro da tarde mansa Agigantou-se a razão De um homem pobre e esquecido Razao porem que fizera Em operário construido O operário em construção
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